segunda-feira, 29 de novembro de 2004

Um dia um Trono será vosso: o do ridículo

A questão tornou-se outra. Curiosa a metamorfose das palavras. Ou melhor, a capacidade que as palavras têm de metamorfosear as coisas. A questão tornou-se outra: extrapolou-se. Falava-se de um facto, discutia-se, as palavras não enganavam: Foi, ou não foi, ou terá sido. Dizia-se que não e que sim e porque isto mas não podem esquecer aquilo, emendava-se, refutava-se, ouvia-se, crescia-se. Mas agora não. Agora remonta-se a 1725 para justificar a queda de um mosquito em plena Avenida. As palavras e as ambições: fundidas. Explosivas, certamente. Porque não? Não, porque as coisas não foram essas. E já ninguém sabe do que se fala. É muito fácil confundir as ideias, as palavras (com outras) quando a ambição sobra e reclama por mais. E talvez por isso já nada se perceba do que se evita dizer. Atira-se a palavra lá para o meio da batalha e defende-se do ricochete. Duas regressam, multiplicadas por mais. Outras, sem nada para dizer, que não ficam sem resposta. Em que ano? Ontem. Foda-se, em que ano?!? 2004. E ficam todos por ali, incendiando uma discussão porque ninguém os ensinou a conversar. Extrapolou-se: já não se diz nada. E eu apenas isto: Não contem comigo para incêndios de nada.

sábado, 20 de novembro de 2004

O Aviso!

A idade, infelizmente, não perdoa. Todos vamos envelhecendo, a pouco e pouco, e os meus amigos são, inevitavelmente, uma excelente expressão disto. Um dos tiques da idade é o iniciar da aquisição de toda uma série de expressões, gestos, frases feitas. Uma delas é o típico "Eu bem avisei". É rude, mesquinho, pretencioso e, em boa verdade, desmotivador de diálogos.

Apetece-me citar (e posso fazê-lo, uma vez que este espaço apenas possui dois proprietários ou, numa expressão menos capitalista, moderadores) a Lei de Imprensa, cuja última revisão data de 13 de Janeiro de 1999. Em boa verdade, só me interessam, para o caso, não desfazendo, as alíneas 2 e 3 do 1º artigo: "2 - A liberdade de imprensa abrange o direito de informar, de se informar e de ser informado, sem impedimentos nem discriminações. 3 - O exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura."

A Associação Académica da Universidade do Minho (de ora em diante, se necessário, o que não me parece, referida como AAUM) segue, num regime hierárquico perfeito, todas as directivas governamentais, mormente as que aos órgãos de comunicação social se dirigem. (O meu objectivo, não alcançado por má escolha das palavras, era que esta frase se revestisse de uma ironia sagaz.) A AAUM (afinal, usei a sigla!) era proprietária de uma publicação semanal que, habitualmente, trabalhava numa relação de tu pagas a impressão e eu não falo mal de ti (onde é que eu já ouvi isto?). De vez em quando, lá surgia um maluquito (apesar de não parecer, não se pretende que este vocábulo seja insultuoso, discriminatório, mas sim, à sua maneira, um tanto ou quanto carinhoso) ou outro que, almejando demonstrar coragem, se virava ao dono (sempre adorei esta expressão que, por acaso, não é minha). (Reparem, agora, no encadeamento de sucessivas e requintadas metáforas:) Ora o dono, sentindo-se ultrajado, pegava num jornal e, à boa moda portuguesa, ia espancando docemente (é possível?) até conseguir o amestramento do(s) infractor(es). Como este processo não funcionasse, pasmo total, a AAUM (terceira vez) decidiu, pura e simplesmente, dissolver a redacção do periódico e, também à boa moda portuguesa, assumiu aquele ar meio afectado que eu costumo intitular de nós por cá, tudo bem.

A idade, de facto, vai avançando e eu começo, já em novo, a ter alguns tiques desse amadurecimento. Também já adquiri toda uma série de expressões, gestos, frases feitas. E já que disso falamos, apetece-me dizer (e, mais uma vez, posso): Eu bem avisei!

PS - Perdoem-me o regionalismo do tema apresentado mas, de vez em quando, dá-me para a felonia...

quinta-feira, 18 de novembro de 2004

Silêncio

Os meus silêncios mais valiosos ocorrem quando deixo falar quem sabe. Olhem só este Senhor:

"Quando bush fez o seu discurso visionário a anunciar que ia levar a democracia ao Médio Oriente, Yasser Arafat era já um líder democraticamente eleito, ao contrário do que sucede em quase todo o Médio Oriente. Foi imediatamente posto de lado. Decidiram que não o queriam, porque não fazia o que lhe diziam. É por isso que estavam encantados com Portugal e Espanha [digo eu: note-se: antes da Invasão ilegal de territórios iraquianos], mas não com a França e a Alemanha. No caso de Portugal, não conheço os números, mas sei que a maioria da população era contra a guerra. Em Espanha o Governo deu o seu apoio contra a esmagadora vontade da população. (...) Em França e na Alemanha agiram de acordo com a vontade das pessoas. Por isso, em relação a Arafat, se arranjarem alguém que permita a Israel ficar com a maioria dos territórios ocupados, muito bem. Será pura democracia."

Noam Chomsky, in Visão nº610